Obesidade em felinos: um perigo real

Obesidade em felinos: um perigo real

O combate à obesidade em pets tem sido um dos desafios da Medicina Veterinária no século XXI. “A tendência ao ganho de peso é inerente ao estilo de vida atual dos gatos. Mais de 50% estão acima do peso ou obesos”, aponta Letícia Tortola, médica-veterinária mestre em Nutrição de Cães e Gatos.
Redução de qualidade e de expectativa de vida dos pets são duas consequências. Porém, a obesidade em felinos pode acarretar muitos outros problemas de saúde. “A obesidade é uma doença muito preocupante e traz impactos ortopédicos, na pressão arterial, nos níveis de triglicérides e colesterol, ocasiona hepatopatias e aumenta a predisposição ao diabetes, principalmente em gatos, além de reduzir a expectativa de vida em até 2 anos”, aponta a Profa. Dra. Vanessa Uemura da Fonseca, endocrinóloga que atende na clínica Concept Care, de Santo André, SP. Ainda segundo ela, um grande desafio é o fato de o tutor subestimar o real escore corporal do pet, especialmente os gateiros. “Quando o tutor não reconhece que existe uma obesidade é difícil conscientizá-lo. Assim, as ferramentas de conscientização do tutor e a comunicação do veterinário é algo que tem sido trabalhado na endocrinologia e na nutrição veterinária, bem como na rotina clínica”, diz.
Dr. Fabio Alves Teixeira, editor do livro “Obesidade Em Animais De Companhia”, revela que a prevalência da obesidade em felinos é maior do que em cães e um dos grandes desafios é que ela seja tratada como doença e que o tutor busque ajuda veterinária antes que o pet comece a sofrer as consequências da obesidade. “As pessoas procuram ajuda apenas quando a obesidade causa um diabetes ou quando o animal começa a claudicar, causando uma lesão articular. Hoje a obesidade é associada até à ocorrência de câncer. Então é bem importante que se faça o diagnóstico e tratamento o quanto antes”, alerta.

PREVENÇÃO
Oferecer um alimento com nutrientes balanceados, bem como estimular hábitos saudáveis na rotina do pet podem ajudar a manter o gato no peso ideal, aponta Letícia. “Seguir a quantidade diária recomendada pelo veterinário ou indicada na embalagem; ao invés de petiscos, fornecer parte desta quantidade diária como recompensa para seu gato; estimular a atividade com brincadeiras em casa e comedouros interativos”, lista.
Para Mayara Andrade, médica-veterinária nutróloga, fazer o tratamento coadjuvante pode ser uma boa saída para tratar doenças especiais e, inclusive, em quantidades adequadas, pode ajudar a manter o peso correto. “Hoje, a obesidade é a doença nutricional de maior incidência em cães e gatos. Se não cuidamos da alimentação associada à atividade física, pode acontecer o ganho de peso. Então, é responsabilidade do médico-veterinário avaliar se a nutrição básica, na fase de vida ou numa necessidade específica, está adequada”, afirma Mayara.

Foto: Myskina6/iStockphoto “ - A tendência ao ganho de peso é inerente ao estilo de vida atual dos gatos. Mais de 50% deles estão acima do peso ou obesos aponta Letícia Tortola”

TRATAMENTO
A chave para o sucesso na perda de peso está em garantir um déficit calórico diário, ou seja, reduzir o número de calorias consumidas para ficar abaixo do gasto energético do animal, por meio de dietas com menor quantidade de energia do que o necessário para manter o peso corporal. Isso criará um balanço energético negativo, levando à mobilização das reservas de energia corporal por meio do catabolismo de gorduras endógenas. É essencial lembrar também, de acordo com Mayara, que o alimento coadjuvante voltado para a perda de peso deve ser prescrito e sua oferta deve seguir a orientação do médico-veterinário que irá acompanhar todo o tratamento, bem como o pós da perda de peso do pet. O médico-veterinário também vai determinar qual o melhor alimento para a manutenção do peso, auxiliando, dessa forma, em uma vida mais longa e saudável para os gatos. “Além disso, o tratamento da obesidade, assim como a doença, também é multifatorial, ou seja, não é baseado somente na mudança da alimentação. A prática de exercícios físicos aliada à alimentação adequada em quantidades controladas junto do comprometimento e entendimento do tutor são os mecanismos chave para o sucesso no tratamento dessa enfermidade”, acrescenta Mayara.
“Vale ressaltar que, mesmo após a perda de peso necessária, é fundamental manter uma alimentação completa e balanceada, de excelente qualidade, adequada ao porte, à fase de vida e às necessidades específicas, inclusive nas quantidades recomendadas, para que não haja ganho de peso novamente”, alerta Mayara.
Dr. Fabio acrescenta ainda um desafio do tratamento da obesidade, que é o de fazer com que o pet emagreça sem passar muita fome, fazendo com que os tutores não consigam manter o tratamento da obesidade. Além disso, é preciso garantir que os animais de estimação não tenham uma ingestão baixa de nutrientes. “Às vezes as pessoas reduzem tanto a alimentação do animal de estimação que o paciente corre o risco ter uma redução de peso com deficiência nutricional, perda de musculatura, redução de imunidade e problemas de pele”, alerta.

RAÇÃO LIGHT OU OBESITY?
O uso de alimentos light ou para gatos obesos faz parte do tratamento. “Os alimentos para gatos castrados ou light (a depender do fabricante) são indicados para auxiliar na manutenção do peso do animal, porém quando o pet está acima do peso ideal e a perda de peso é indicada pelo médico-veterinário, a prescrição é oferecer o alimento coadjuvante para obesidade”, explica Gustavo Quirino, médico-veterinário com experiência em práticas de ensino e nutrição de cães e gatos.
“Enquanto os alimentos light são recomendados para cães com tendência a ganho de peso ou sobrepeso, o alimento para cães obesos é indicado quando a doença já está estabelecida, ou seja, para o tratamento da obesidade. Geralmente, um alimento light é indicado para cães saudáveis com 10 a 15% de peso a mais e o alimento para obesos para animais com 30% ou mais do peso considerado ideal”, diferencia Mayara.
Rafael Vessecchi Amorim Zafalon, doutorando em Nutrição e Produção Animal com ênfase em Nutrição e Nutrologia de Cães e Gatos pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ/USP), explica que a grande diferença é que os alimentos indicados para emagrecimento apresentam maior quantidade de nutrientes por calorias. “Essa característica é crucial para que seja possível fornecer menor quantidade de calorias sem comprometer o aporte adequado de nutrientes, pois o objetivo é proporcionar um déficit de calorias, mas não um déficit de nutrientes. Outra característica importante dos alimentos indicados para o emagrecimento é o alto teor de proteína, que auxilia na manutenção de massa magra durante o programa de emagrecimento”, diz Rafael. Ainda segundo o médico-veterinário, a diferença em relação aos alimentos light e para obesidade de cães está nas concentrações de alguns nutrientes, pois os gatos são mais exigentes que os cães do ponto de vista nutricional. “Um exemplo é o teor de proteína (e aminoácidos essenciais) maior nos alimentos para gatos, além de outras diferenças justificadas pelas particularidades nutricionais dos felinos, independentemente de o alimento ser indicado para emagrecimento ou manutenção, como adição de taurina (essencial para gatos, não para cães). Além do perfil nutricional diferente, esses alimentos podem apresentar adição de componentes nutricionais que auxiliam na redução de peso, bem como no controle de algumas alterações associadas à obesidade. Um exemplo é a adição de L-carnitina, um aminoácido que auxilia na ‘queima de gordura’. A obesidade é caracterizada como uma condição inflamatória, portanto a adição de componentes que reduzam a inflamação é benéfica”, acrescenta.

Foto: Svetlana Sultanaeva/iStockphoto - “As pessoas procuram ajuda apenas quando a obesidade causa um diabetes ou quando o animal começa a claudicar, causando uma lesão articular. Hoje a obesidade está associada até à ocorrência de câncer em pets aponta Dr. Fabio Alves Teixeira”

ALIMENTO ÚMIDO
Muitos gateiros acreditam que o alimento úmido é um vilão, causando a obesidade ou o sobrepeso. Porém, Gustavo explica que o alimento úmido é um grande aliado para o sucesso do programa de perda de peso, tanto para cães como gatos. “Porém, é preciso ficar atento, pois nem todos os alimentos úmidos podem ser utilizados em qualquer quantidade no emagrecimento desses animais. O ideal é fornecer o alimento úmido formulado especificamente para obesidade, para que o animal não tenha nenhuma deficiência de nutrientes ao longo da perda de peso. De maneira geral, a versão úmida do alimento coadjuvante para obesidade possui todos os diferenciais da sua versão seca, porém oferece benefícios adicionais que contribuem para a perda de peso, como: contribui para a sensação de saciedade, pois são formulados com baixo teor calórico, já que são compostos de, no mínimo, 60% de água; e permite ao tutor variar a alimentação, pois uma das maiores dificuldades no tratamento da obesidade é a adesão ao tratamento, já que a maior parte da população enxerga a comida como uma forma de demonstrar afeto ao cão/gato, e a quebra desse vínculo pode ser um desestímulo; e ainda colabora para a saúde do trato urinário, graças ao seu alto teor de água, que leva a uma maior ingestão de água de forma involuntária e, consequentemente, deixa a urina menos concentrada”, finaliza Gustavo.

Participações:

Dr. Fabio Alves Teixeira, Médico-veterinário com residência em Nutrição e Nutrição Clínica pela Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da UNESP. Mestre e doutor em Ciências pela FMVZ/USP. Professor orientador do Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Clínica Veterinária da FMVZ/USP, coordenador do curso de Pós-graduação Lato Sensu em Nutrição e Nutrologia de Cães e Gatos- Anclivepa-SP, docente da Faculdade Anclivepa, membro fundador da Sociedade Brasileira de Nutrição e Nutrologia de Cães e Gatos e da Nutricare Vet.

Mayara Andrade, Médica-veterinária Nutróloga com residência em clínica médica e especializada em Nutrologia e Nutrição de Cães e Gatos pela Anclipeva-SP 1ª turma. Atua na indústria pet food há 10 anos, sendo seis como consultora técnica e quatro atuando na área de marketing e comunicação científica.

Dra. Vanessa Uemura da Fonseca, Médica-veterinária pela FMVZ/USP com pós-graduação lato sensu em Endocrinologia e Metabologia de Pequenos Animais pela ANCLIVEPA/SP. Possui Mestrado e Doutorado em Ciências pela FMVZ/USP. Diretora de cursos na empresa Pesquisas Hormonais. Membro da diretoria da ABEV. Atendimento especializado em Endocrinologia Veterinária na clínica Concept Care.

Rafael Vessecchi Amorim Zafalon, Coordenador de Capacitação Técnico-Científica da PremieRpet. Médico-veterinário formado pelo Centro Universitário de Rio Preto (UNIRP) e mestre em Nutrição e Produção Animal com ênfase em Nutrição e Nutrologia de Cães e Gatos pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ/USP). Atualmente é aluno de doutorado em Nutrição e Produção Animal com ênfase em Nutrição e Nutrologia de Cães e Gatos pela mesma instituição.